Tão logo o presidente da Câmara Eduardo Cunha recebeu o pedido de
impeachment, a legalidade e constitucionalidade desse ato começou a ser
questionada. Os Deputados Paulo Pimenta (PT-RS), Paulo Teixeira (PT-SP) e Wadih
Damous (PT-RJ) anunciaram que estão preparando medidas judiciais contra o ato
de Cunha. O deputado Rubens Pereira Júnior (PCdoB-MA) já impetrou Mandado de
Segurança no STF. Como sintetizou o Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo em
entrevista hoje, há três linhas de argumentação jurídica na defesa do mandato
de Dilma, a seguir explicadas.
Presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB) |
DESVIO DE PODER. O Presidente da Câmara recebeu o pedido de
impeachment horas depois de o Partido dos Trabalhadores ter anunciado que
votaria pela admissibilidade do processo de sua cassação no Conselho de Ética.
Trata-se de uma retaliação explícita. Os poderes decorrentes de uma função
pública, entretanto, não podem ser utilizados para fim de vingança pessoal ou
para evitar processo contra o titular daquela função. O recebimento de um
pedido como esse deve ser baseado em critérios jurídicos e políticos
consistentes, e esse não foi o caso. O Ministro do STF marco Aurélio Melo já
ratificou essa posição. Até mesmo um dos autores do pedido de impeachment, o
advogado Miguel Reale, disse ter se tratado de “chantagem explícita”.
RITO DO IMPEACHMENT. Segundo argumento contido no Mandado de Segurança
do Deputado Rubens Pereira Junior, o primeiro ponto questionável da atitude de
Cunha é a falta do direito de defesa anterior ao recebimento do pedido de
impeachment. A Lei nº 1.079/1950, que regula o impeachment, é anterior à
Constituição de 1988. A Constituição prevê uma série de garantias
procedimentais (como o direito ao contraditório) que não seriam devidamente
contempladas pela Lei original. Além disso, nem a Constituição nem a Lei dão ao
Presidente da Câmara o poder de receber a denúncia sozinho. Apenas o Regimento
Interno da Câmara afirma isso. E, como sublinhou o Ministro Teori Zavaski na
liminar que deu em outubro suspendendo o rito de impeachment, o artigo 85 da
Constituição Federal “submete à cláusula de reserva de ‘lei especial’ não
apenas a definição dos crimes de responsabilidade do Presidente da República,
como também o estabelecimento das correspondentes ‘normas de processo e
julgamento’." Há outros pontos obscuros, como o critério de definição da
proporcionalidade na formação da Comissão Especial. Por essas discrepâncias
entre o regimento, a Lei e a Constituição, as liminares do STF suspenderam a
eficácia da Questão de Ordem em que Cunha definia o rito do impeachment. Cunha,
posteriormente, revogou a Questão de Ordem, mas, de qualquer modo, não poderia
receber o pedido até o julgamento de mérito pelo STF.
MÉRITO. Existem várias objeções ao mérito do pedido de impeachment
– centrado nas “pedaladas fiscais”. A primeira delas é que justamente ontem o
Congresso aprovou o PLC 5, que permitiu ao governo devolver as “pedaladas” de
2014. A proposta aprovada prevê o abatimento de até R$ 57 bilhões para
compensação dos pagamentos atrasados. A Comissão Especial da OAB criada para
dar parecer sobre o impeachment, por sua vez, decidiu que no mérito o
impeachment é inconstitucional. São três argumentos: a) a decisão proferida
pelo TCU, na sua função de órgão auxiliar do Poder Legislativo, não pode ser
tomada como juízo definitivo para sustentar, autonomamente, a recepção de um
pedido de impeachment; b) práticas ocorridas em mandato anterior não podem
levar ao impeachment no mandato subsequente; c) as supostas irregularidades
cometidas por Dilma não indicam comportamento grave a ponto de justificar a
responsabilização do agente político. Para a Comissão, não se aponta prova da
existência de desvio de conduta revelador de improbidade, com enriquecimento
ilícito, por parte da governante. De acordo com o relatório, as supostas irregularidades
fiscais “teriam como motivo a garantia de saldo em contas do governo com
dispêndios em programas sociais (Bolsa Família, Abono Salarial, Seguro
Desemprego, Minha Casa Minha Vida, Sustentação de Investimento etc.), não para
usufruto pessoal, com apropriação privada de recursos do erário”.
Informações Mancetômetro.com.br