A NOVELA DA VIDA REAL

(Este texto do Alamar foi publicado quando ainda eu escrevia como REVISTADO DO ED e está sendo republicado aqui hoje, por se tratar de uma nova forma de mostrar textos antigos e importantes, nas colunas intituladas ARTIGOS DO ALAMAR REGIS e o REPAGINANDO que pretendo publicar todas os sábados à partir das 19:00 hs.)

Muita gente costuma afirmar que a televisão ensina o que não presta e que é ela a responsável pelas imoralidades que vemos no dia-a-dia.

Não é verdade. O que a televisão mostra, principalmente nas suas novelas, é exatamente aquilo que as pessoas, de fato, fazem no dia-a-dia.

É verdade que ela dá muita divulgação ao que não presta, porque os jornalistas em geral possuem um entendimento de que jornalismo necessariamente é sinônimo de divulgação das desgraças e das coisas ruins de um modo geral.

Esta semana o destaque foi o naufrágio de um navio russo, que deixou dezenas de mortos.

Será que não aconteceram coisas boas e mais relevantes no mundo, para serem notícias com tanto destaque?

Mas o enfoque aqui não é o jornalismo, é a dramaturgia mesmo.

Outro dia vi uma criatura tecer pesadas críticas à Globo, argumentando que ela estimula a infidelidade conjugal. Mas a afirmativa era com tanta veemência, de forma tão insistente e com um nível de protesto tão duro em cima da questão que eu passei a ficar com uma pulga atrás da orelha e imaginei logo: “Aí tem!”.

Não deu outra coisa. Ela também é “infiel” ao seu marido, há muito tempo, e não foi por causa da Globo.

A Psicanálise é perfeita quando afirma que “toda vez que você vê alguém condenar demais algo, certamente deve ter o problema instalado em si”.

O que enfoco neste artigo é a ingenuidade das pessoas em imaginar que as cenas mostradas nas novelas são apenas ficção, que não existem na vida real, que é coisa inventada pelos seus autores e que não acontecem.

É querer enganar a si próprio.

A todo momento a gente vê pessoas dizerem coisas assim:
·         - “Eu estou decepcionada e horrorizada. Nunca imaginei que o meu filho fosse capaz de fazer uma coisa desta. Meu Deus dos Céus, que desgosto”.
·         - “Estou boquiaberto, Célia. Jamais eu poderia imaginar que fosse possível acontecer um roubo como este aqui na empresa, ainda mais pelo Rogério, que parecia ser uma pessoa tão confiável”.
·         - “Mas como é que pode???? Logo o Gustavo, religioso praticante, fala tanto em Jesus, ter sido responsável por um ato tão perverso. Não acredito, não acredito! Sinto muito, mas não acredito!”.
·         - “O quê? A Regina agredir o Celso? Uma mulherzinha daquela, franzina e com pouco mais de metro e meio agredir um homão daquele, com quase dois metros de altura e mais de cem quilos? Não acredito.”.

Pois é gente. Não gosto muito de usar clichês, mas há um que se encaixa bem: “Quem vê cara, não vê coração”.

Existe muito mais gente boa no mundo, do que o que você pode imaginar, mas também existe muito mais gente perversa e bandida, do que o que você possa imaginar, talvez aí pertinho de você, na vizinhança, na empresa, entre os parentes e até dentro do próprio lar. Mais uma vez sugiro, aos amigos, a leitura do meu livro: “Parente, uma praga na vida da gente”.

Aquela mãe que diz que nunca imaginou que o seu próprio filho fosse capaz de fazer algo tão absurdo é porque passa a vida toda fingindo que não está vendo aquilo que está escancaradamente estampado diante dos seus próprios olhos. O mesmo acontece com as pessoas nas empresas, em relação a determinadas criaturas outras.

O campo religioso é um espaço que muito malandro aproveita para se esconder, a fim de praticar as suas imoralidades e sem-vergonhices, sem que ninguém perceba o seu verdadeiro caráter. Usar o nome de Jesus é uma estratégia que cola e dá certo, porque é comum o cidadão ocidental imaginar que todo aquele que se utiliza do nome dele necessariamente tem algum compromisso com a moral ensinada por ele. Ledo engano. E nesta onda, vai aprontando das suas, sem maiores preocupações.

Mas vamos falar das novelas.

Rasga e bota fogo em todas as cartas que chegam para outra pessoa

Você já deve ter visto isto em novelas inúmeras vezes. É aquele personagem que, por ciúme ou por algum tipo de ódio, bloqueia, propositalmente, toda a comunicação entre a pessoa A e a pessoa B, para destruir o relacionamento entre ambos. Geralmente ela é apaixonada por A, ou por B, que não lhe dá a menor bola, mas acha que praticando esse tipo de maldade vai conseguir reverter o quadro e atrair a atenção.

A diferença é que na novela sempre o bandido se dá mal no final, porque a trama sempre é descoberta e o casalzinho mocinho termina bem e o perverso na cadeia. Mas na vida real não.

Muitos relacionamentos são destruídos mesmo, a pessoa A, de racionalidade limitada, entende que de fato a pessoa B não lhe deu importância nenhuma e que nunca lhe escreveu. Passa a não querer mais conversa com ela, recusa-se a atender seu telefone ou a ler seus emails e, em elevado nível de burrice, não dá a menor oportunidade para a pessoa se explicar ou se disponibilizar a conhecer aquilo que eu chamo de verdade verdadeira.

Será que essa pessoa é tão idiota que não é capaz de relembrar cenas semelhantes acontecidas em diversas novelas?

Sabotagem para fazer o outro perder o emprego

As novelas mostram, a todo momento, aquele bandido que pratica todo tipo de sabotagem para que um colega de trabalho seja demitido de uma empresa. Geralmente as vítimas são funcionários honestos, dignos, produtivos, verdadeiramente trabalhadores, fiéis e que não se compactuam com roubos, safadezas e canalhices que muitos promovem nas empresas.

O bandido quer continuar roubando e praticando todas as suas sujeiras sem ser incomodado.

Aí começa a colocar bens da empresa na bolsa ou na gaveta da sua vítima e arruma um jeito de fazer a denúncia ao patrão, sempre anônima, para que ele dê uma incerta de vigilância na bolsa dela. Alguns vão mais longe: aproveitam-se de um descuido ou da hora que a vítima vai ao banheiro, pegam a chave do seu carro e conseguem colocar bens da empresa na mala do carro, para, depois, alertar anonimamente a vigilância a abordar o carro, na hora da saída.

E o imbecil do patrão sempre vai na onda e cai no conto da vigarice, botando na rua um funcionário que ele jamais deveria demitir.

Isto acontece na vida real, a todo instante, e empresários e patrões continuam a praticar a mesma imbecilidade, mesmo vendo os alertas nas novelas o tempo todo.

No lar acontece isto também. É o filho mau caráter que sabota o seu irmão, que não é bandido como ele, para que os pais, idiotas, passem a entender que de fato o outro é bandido também. Muitos pais vão na onda.

A indústria da difamação

Esta acontece muito, também, e chega a ficar até registrada NA HISTÓRIA, levando gerações e gerações a considerar como sendo verdade aquilo que apenas foi inventado por interesses de canalhas.

O caso de Lampião é um exemplo disto. Ficou na cultura de um país gigantesco que ele foi um bandido sanguinário. Fizeram filmes e mais filmes retratando a sua “história”, conforme aquilo que o interesse dos poderosos e verdadeiros bandidos da sua época desejaram que fosse. E todo o mundo vai na onda.

Jesus foi outra vítima da difamação. Quem o assassinou foi o povo, que foi na onda montada por canalhas. O soldado romano foi apenas o instrumento de execução. Pôncio Pilatos foi o bode expiatório.

Tem gente que é tão burra que, mesmo convivendo com pessoas que são boas, alegres, carinhosas, afetuosas, bem humoradas, honestas e dignas, vão na onda de um safado qualquer que venha a dizer que ela é má, mal humorada, grossa, desonesta e indigna.

As pessoas são tão tapadas, que poderiam dizer:
- “Você me desculpe, mas o que eu sei, já testemunhei e afirmo é que essa pessoa não é nada disto que você está dizendo. Sempre me tratou bem, é uma pessoa carinhosa e não grosseira, é uma pessoa bem humorada e não mal humorada como você quer fazer que eu creia, nunca praticou qualquer ato indigno contra mim... A sua maledicência pra mim não cola.”

Mas não dizem.

Por que tanta gente adora deixar que os outros elevem os seus coeficientes de idiotia?

A internet hoje é o maior instrumento de difamação que existe. Se você quiser destruir alguém, basta postar um boato qualquer por e-mail que um monte de besta sai retransmitindo, sem se dar ao trabalho de averiguar a fonte ou se tem sentido.

- “Globo ficou com dinheiro do Criança Esperança”.
- “Alexandre Garcia demitido da Globo.”
- “O Deputado Jutahy Magalhães...”
- “Encontraram barata na comida do restaurante tal”
- “Atriz Fulana transando com Cicrano”.

E aqui eu quero lhe dar um alerta:

Muito cuidado antes de retransmitir qualquer mensagem difamando alguém ou alguma coisa pela internet. Hoje já existe tecnologia muito avançada para identificar de onde veio a mensagem. Em São Paulo, por exemplo, a Divisão de Crimes Eletrônicos do DEIC é eficientíssima, quanto a isto, e vai mesmo na fonte. E não é só em São Paulo não, as polícias de todo o Brasil estão desenvolvendo meios de inteligência para coibir os crimes pela internet.

Se eu retransmito alguma difamação e a vítima se queixar na polícia o e-mail que eu enviei, identificando o meu IP, a polícia poderá vir atrás de mim e não adiantará eu vir com conversa do que “me mandaram e eu mandei em frente”.

É bom que todos saibamos que os bandidos mais espertos, quando promovem as difamações, fazem de tudo para não deixar rastros e com certeza você não vai conseguir identificar, para a polícia, quem de fato é o autor da difamação. Sobra pra você.

Na novela o verdadeiro bandido sempre é preso, mas na vida real não, e muita gente inocente, porém boba, é condenada. Sofre porque é burra.

Tudo depende da sua inteligência e do seu nível de visão.

Lembra-se daquela matéria que eu enviei para todos os meus leitores, com o título mentes, culturas e níveis diferenciados? (clique para ler, se não leu ainda).

Tem a pessoa de nível 1, que a sua mente só consegue visualizar o número 2, depois do número 1; tem a de nível 2 que já consegue visualizar os intervalos decimais, depois o nível 3 que vê os centesimais e assim sucessivamente até o nível de visão mais profunda?

Pois é. Os canalhas se aproveitam das pessoas de nível 1, sabendo que elas não terão capacidade para perceber o íntimo das suas canalhices, caem na arapuca facilmente  e terminam fazendo-as de vítimas das suas safadezas. É como o traficante que se aproveita da ingenuidade de menores para poder traficar a droga fazendo-a chegar ao seu destino.

Paremos então de achar que os bandidos das novelas só existem nas novelas e que aqueles métodos aplicados são apenas coisas da cabeça da Glória Perez, do Agnaldo Silva, do Walcir Carrasco, do Manoel Carlos e dos outros novelistas.

O sucesso dos bandidos depende do nível de inteligência do povo para o qual eles falam.

E por falar em novelas...

Tipos, como o Timóteo, de "Cordel Encantado", existem aos montes, gente. Quantas pessoas entram processos de loucura para conseguir ficar com uma outra pessoa, custe o que custar, faça o que precisa ser feito. Ele sofre de uma obsessão terrível pela Açucena. Sabe que ela não quer nada com ele, tem nojo dele e não suporta ele, mas insiste e determinou que tudo tem que ser conforme ele quer. O cara já até raptou a menina várias vezes, todo mundo na cidade sabe do seu banditismo, do seu mau caratismo e da sua perversidade, ninguém faz nada contra ele e, o que é lamentável, todo mundo quer prender e destruir exatamente o pobre do Jesuíno, que é o justo, honesto, correto e decente.

Na vida real tudo acontece exatamente daquele jeito.

Em "Morde e Assopra", a bandida da Celeste, promove todo tipo de mau caratismo, porque determinou que o idiota do Abner tem que ser dela, todo mundo sabe que ela é canalha, o próprio palhaço, sua vítima consciente, sabe do seu caráter atrofiado, no entanto deixa que novas estratégias sem vergonha voltem a acontecer, fingindo que não sabe quem ela realmente é.

Na vida real aquilo acontece a todo instante e todo mundo finge que não está vendo.

Em "Insensato Coração" a gente vê vários bandidos, como o Léo, que foi denunciado pelo seu próprio pai e seu próprio irmão, um mau caráter explícito, e muita gente não faz o menor esforço em procurar ver quem ele realmente é e deixa a vida ir acontecendo... E a outra idiota ainda aceitou se casar com ele, cegando-se para toda uma realidade, mesmo diante do alerta do pai dele, vindo a se arrepender depois. Poderia ter sido morta por ele.

As pessoas sempre condenam quem não merece ser condenado e fazem os jogos dos bandidos.

As novelas mostram essas coisas de forma tão clara que mesmo quem não se dispõe a ver novelas, bastar ficar com a televisão ligada, que consegue perceber que existe e como são feitas as safadezas. Por que as pessoas, sabendo disto, não passam a se prevenir contra as mesmas práticas, que acontecem na vida real?

Repito algo que sempre disse: enganar os outros é questão de honestidade, mas enganar a gente mesmo é questão de burrice.

Para a apreciação de todos.

Com um forte abraço.



(Este texto do Alamar foi publicado quando ainda eu escrevia como REVISTADO DO ED e está sendo republicado aqui hoje, por se tratar de uma nova forma de mostrar textos antigos e importantes, nas colunas intituladas ARTIGOS DO ALAMAR REGIS e o REPAGINANDO que pretendo publicar todas os sábados à partir das 19:00 hs.)